domingo, 25 de fevereiro de 2024

Tchello d`Barros - dois poemas

 

RISCO OU RABISCO

 

A vida em si é um risco

e pode ser dolorido

não tem mapa nem aviso

o mundo ataca de frente

e por mais que você enfrente

te pega desprevenido

 

A vida é um rabisco

e do muito que nos dói

por vezes não faz sentido

aquele beijo não dado

um verbo que jaz calado

o amor que não foi vivido

 

A CASA QUE MORA EM MIM

 

A casa que mora em mim

Hoje é fotografia

Só lembrança que não morre

São portas ainda abertas

Janelas de vento e sol

     Sussurram velhas paredes

     De tábuas de pinheiro

     E contam que o vô e a vó

     Brincavam com os seus netos

     Nas noites frias de inverno

 

A casa que mora em mim

Essa foto em preto e branco

Bem mais que dias e datas

Jardim florido na frente

Atrás a pequena horta  

     Foi lugar feito de afetos

     Já foi sótão e porão

     Mãe com roupas no varal

     E pai vindo da labuta 

     A ceia já está na mesa

 

A casa que mora em mim

Traz música aos ouvidos

Nas canções do velho rádio

No latido dos cachorros

E os violões nos saraus

     É um tal de recordar

     De encontrar dentro da gente

     Crianças em alvoroço

     Choro de mais um bebê

     E houve até um papagaio

 

A casa que mora em mim

De pau de pedra de vidro

Não tinha muro ou cercado

Mas tinha fogão à lenha

Aroma de pão assado

E o chimarrão doce-amargo

     É nostalgia que dói

     N’algum canto aqui dentro

     Desse lugar de morada

     Que alguns chamavam casa

     E uns outros diziam lar

 

A casa que mora em mim

Ela já não mais existe

Mas ainda é bonita

Quadro que dura no tempo

Gente que vem e se vai

     (Uns para não mais voltar)

     O tempo levou a casa

     Mas permanece tão viva

     Nestas mãos envelhecidas

     Que seguram esta foto

 

A casa que mora em mim..

 

                Tchello d'Barros


domingo, 4 de fevereiro de 2024

Artur Gomes - O Homem Com A Flor Na Boca

Artur Gomes

O Homem Com A Flor Na Boca

Um Canibal Tupiniquim

 por Fernando Andrade | escritor e jornalista

 Um homem cita um poema de nome. O músico já usou a cítara para musicar este poema pelo nome. Tudo já foi transformado, o poema para canção, a rima comeu a melodia e fez troça e troca de nome. Mas o poema do livro O homem com a flor da boca, da editora Penalux, nos devolve este país, do samba, do riso piada, Leminski, a força do ato canibalista de deglutir o que veio antes da poesia concreta, até a letra da canção de Luiz Tatit. Artur Gomes fez das suas, com tanta fome, comeu a maioria dos poemas que leu na vida e canibalizou e carnavaliza referências, citações, humor de longa estrada, ou beira de bar, trabalhando com gume de faca afiada e o lume de um pôr do sol em Ipanema, lembrando Vinícius.

São poemas bons para musicar tanto na solidão de um violão, quanto, atravessada por uma voz tenor, sax soprano. E não falta sexo, sacanagem, tesão, nas palavras das palavras num atravessamento em plena Quarta feira de cinzas, no resultado do carnaval. O desbunde da bunda, o levante dos órgãos, a gíria, e a menina com fio da linha escrita, carregando anedotas, fábulas e circos. O poeta não faz gênero, ele é macho, e fêmea, Simone, em segundo sexo. São poemas para emprestar ao amigo que está com fone de ouvido se atentar para a prosódia do verso, para quem sabe não copiar e transformar Amor em flor na boca.

 

https://www.literaturaefechadura.com.br/2024/01/22/livro-de-poemas-o-homem-com-a-flor-na-boca-canibaliza-a-historia-brazuca-do-verso-em-poemas-tropicalistas/


                          poesia

 

I

chegas a mim

como uma égua assanhada

não quer saber do meu carinho

só quer saber de ser trepada

 

II

 

eu te penetro

em nome do pai

do filho

do espírito santo

amém

 

não te prometo

em nome de ninguém

 

terra

 

amada de muitos sonhos

e pouco sexo

deposito a minha boca

nu teu cio

e uma semente fértil

nos  teus seios como um rio

 

Artur Gomes

Suor & Cio – MVPB Edições - 1985

https://personasarturianas.blogspot.com/


Sarau Campos VeraCidade

Sarau Campos VeraCidade   Dia 15 de Março 19h - Palácio da Cultura - música teatro poesia   mesa de bate-papo :um olhar sobre a cidade no qu...